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Dor (2018) 26
taneidade e das partes saudáveis da pessoa. Observando-se, igualmente, o poder que este modelo psicoterapêutico tem em descentrar a pessoa nas posições de excessiva vigilância da dor e do caráter dos pensamentos catastróficos e resistência à mudança.
O encorajamento à expressão das problemá- ticas emocionais, a capacidade de improvisa- ção, a exploração da imagem corporal, plastici- dade adaptativa e dos vários papéis sociais e familiares são objetivos contemplados.
A pessoa é espetador de si mesmo e do outro. Amplia o seu desenvolvimento pessoal, desins- talando o excesso de identificação à doença, como principal papel de vida. A narrativa trans- forma-se.
Deste modo, objetiva-se o desbloqueio dos sentimentos de impasse, ansiedades catastrófi- cas, comportamentos e estratégias patogénicas. Objetiva-se, igualmente, o contacto com as ex- periências genuínas e íntimas, para promover a motivação para uma mudança saudável. Refor- ça-se, deste modo, o encontro empático e a função geradora de significados mais toleráveis à mente humana.
Se é verdade que a arte que inspira o psico- drama é o teatro, na musicoterapia será a músi- ca.
No CMDBCL, optou-se por criar este encontro entre as linguagens complementares do psico- drama e da musicoterapia, onde a DC é o pon- to de partida e o ponto de chegada será a pes- soa reabilitada na sua dimensão psicossocial, incluindo-se-lhe a autonomia de tomada de de- cisão e de escolha.
Efetivamente, existem pontes comuns e com- plementares entre o psicodrama e a musicotera- pia. E optou-se por realizar grupos terapêuticos, com este modelo integrado para o tratamento da DC, na frequência semanal, sustentado na cons- trução de um lugar de intimidade, de escuta particular, de criatividade e descoberta de ser- -se mais quem se é.
Musicoterapia para a dor crónica
A música é um recurso comum para a dimi- nuição da ansiedade e da dor, procurada para experiências de bem-estar e de relacionamento. A musicoterapia, como método não farmacoló- gico da terapia da DC, dirige experiências mu- sicais ao abrigo dos objetivos da equipa multi- disciplinar.
É num processo sistemático, dentro do con- texto de uma relação terapêutica, que o musico- terapeuta aplica as técnicas que otimizam os efeitos sociais, emocionais, cognitivos, compor- tamentais e fisiológicos da música, na pessoa e no grupo.
O neurologista Oliver Sacks distingue a mobi- lização fomentada pela música para a coesão humana8. Esta é uma função empática que per-
16 mite atender a necessidades relacionais da pes-
soa com DC. A música fornece um sentido de intencionalidade compartilhada9 que é utilizado na musicoterapia para o estabelecimento de confiança, facilitando a interação, a coordena- ção e a cooperação entre pessoas10.
A ressonância afetiva da música torna-a um veículo de expressão capaz de comunicar emo- ções básicas11, assim como sentimentos ambi- valentes, muitas vezes presentes na pessoa com DC. A musicoterapia assegura a utilização da música para regular a excitação emocional e o humor.
A música foca a ação e o pensamento na reatualização de experiências passadas, na vi- vência do presente ou na previsão de cenários futuros. A pessoa com DC desenvolve a sua musicalidade com as suas capacidades atuais. Em contraste com situações de perda e incapa- cidade, a aquisição de capacidades musicais potencia benefícios para o bem-estar, funções cognitivas e motoras.
A rede bilateral de regiões cerebrais ativada pela música está relacionada com a atenção, processos semânticos, memória, funções moto- ras e processos emocionais12. Envolve a ação intencional e o planeamento do comportamento motor13, envolvendo a pessoa com DC na sua mobilização.
A música produz ainda uma redução na inten- sidade da dor, como conclui uma revisão que apresenta 31 estudos14. Aumenta a libertação de endorfinas e encefalinas, atuando na inibição descendente da dor15.
Melzack, Wesz e Sprague16 sugerem que a estimulação auditiva através da música, conju- gada com sugestão, poderia efetivamente abolir a dor. Contudo, a duração da tolerância à dor não tem um aumento significativo. Estes resulta- dos apoiaram a integração dos processos psi- cológicos no tratamento da dor, que exercem um controlo dinâmico sobre os padrões de impulsos nervosos que influenciam a perceção de dor.
O psicodrama e musicoterapia, através das suas técnicas e estruturas, afirmam e ampliam a comunicação, o autoconhecimento, a integra- ção social e uma modulação da DC na linha da maior tolerabilidade. Neste lugar, a pessoa terá a oportunidade de recriar novos significados à sua história da dor, através da capacidade do reequacionar as necessidades, desejos, encon- tros relacionais e novas escolhas.
Conclusão
A DC desafia os profissionais de saúde a re- pensarem-na, através da cumplicidade multidis- ciplinar dialogante, dos modelos teóricos e de intervenção multimodais.
A articulação do psicodrama com a musicote- rapia tem-se revelado um dos instrumentos psi- coterapêuticos eficazes no tratamento da DC e da dor psíquica associada, muitas vezes irrepre- sentável e incomunicável. A sistematização des-
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