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Dor (2018) 26
foi feita a distinção entre os dois tipos de dor. Os dados do presente estudo revelaram que, dos 111 pacientes com dor no último ano, 59,7% têm dor há mais de três meses e 31,9% expe- rienciam dor mais do que uma vez por semana. Confirma-se assim que a dor é uma condição muito significativa, também na vida da maioria das pessoas portuguesas com hemofilia. Este facto é ainda sublinhado pela elevada duração e frequência da dor apresentada pelos adultos, que chega a ter uma duração superior a 50 anos e uma frequência semanal, diária ou até cons- tante. A presença de dor em várias articulações na mesma pessoa, já descrita noutros es- tudos27,49, contribui também para enfatizar o grande desafio que constitui a gestão da dor relacionada com a hemofilia, já que será par- ticularmente desafiante controlar e conviver com dor que ocorra em múltiplas localizações.
A intensidade da dor nas pessoas com hemo- filia tem sido abordada em vários estudos, mas apenas em termos de intensidade mínima, média e máxima9,17,18,49, e sem se focar em situações específicas, o que pode não captar completa- mente a realidade desta dor. Outros trabalhos focaram ainda valores de intensidade para dor aguda vs. crónica, mas sem discriminar diferen- tes fatores precipitantes14,15,19,52. Este questioná- rio, o QMDH, avalia intensidade de dor quer em situações agudas (hemartroses) quer em situa- ções mais associadas com dor crónica (por exemplo, depois de descansar ou estar parado). Desta forma, a avaliação da dor em diferentes situações (além de uma pontuação média de intensidade), é um ponto forte do questionário, com elevada utilidade para a prática, já que podem ser extraídos dados mais detalhados para informar medidas de intervenção.
Relativamente à interferência da dor, tanto adultos como crianças/adolescentes referiram maior interferência na «capacidade para andar a pé», «trabalho normal» (em casa ou na esco- la) e «atividade geral», em linha com outros es- tudos recentes nos quais a maioria dos pacien- tes indicou que a hemofilia tem um impacto negativo nas atividades laborais, diárias e de lazer9,20,27,53,54. Por outro lado, a menor interfe- rência refere-se às dimensões mais afetivas e interpessoais («relacionamento com os outros» e «prazer de viver»), tal como também já foi reportado9. Na prática clínica, compreender a interferência da dor na vida dos pacientes con- tribui para desenvolver planos de intervenção mais adaptados, de acordo com as dificuldades individuais, e com o foco mais dirigido à incapa- cidade física ou ao bem-estar emocional.
Quanto às medidas utilizadas para gerir a dor, a maioria dos pacientes referiu recorrer aos ele- mentos da estratégia RICE (rest, ice, compres- sion e elevation), tal como recomendado pelas normas atuais1,11. O concentrado de fator surge também como uma das estratégias mais utiliza-
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da dor. Neste caso, é importante notar que a administração de fator não é uma medida reco- mendada para a redução da dor, mas para parar a hemorragia que subjaz à dor aguda. Em Por- tugal, o tratamento com concentrado de fator é acessível a todos os pacientes em caso de he- martrose (on-demand), tendo também vindo a ser registado um maior acesso dos pacientes ao tratamento em casa55. Quanto à profilaxia, esta forma de tratamento é amplamente administrada às crianças com hemofilia grave nos países de- senvolvidos56, sendo o elevado custo destes tratamentos o principal obstáculo à sua maior generalização, que ainda limita a adoção do tratamento profilático pelos adultos. De facto, o acesso à profilaxia nas crianças portuguesas com hemofilia (entre 76 a 100%) é superior ao dos adultos (entre 26 a 50%), de acordo com um recente survey europeu sobre esta ques- tão.55 Sublinhe-se ainda que a profilaxia não era ainda uma opção terapêutica durante a infância das pessoas com hemofilia agora em idade adulta. Assim, estes pacientes cresceram sem qualquer forma de tratamento preventivo, pelo que a maioria apresenta atualmente algum grau de desgaste articular (artropatia hemofílica).
Relativamente aos profissionais consultados para gerir a dor, é de notar o desejo de consultar profissionais que implementam terapias não far- macológicas. De facto, alguns autores recomen- dam que os tratamentos não farmacológicos, como as intervenções psicossociais, devem ser uma opção para gerir a dor relacionada com a hemofilia10,11. Em Portugal, todos os cidadãos têm acesso ao Serviço Nacional de Saúde, mas a disponibilidade de algumas especialidades, como a Psicologia, é limitado pelo reduzido nú- mero de profissionais integrados nos serviços públicos. Além disso, o acesso a terapias com- plementares (por exemplo, acupuntura) é tam- bém reduzido nos hospitais públicos. Em conjun- to, esta realidade ajuda a explicar que o recurso a este tipo de intervenções e terapias seja inci- piente entre as pessoas com hemofilia, apesar das recomendações que aconselham uma com- binação de medidas farmacológicas e não far- macológicas (como as intervenções psicosso- ciais), para a otimização da gestão da dor na hemofilia10,11. De acordo com um survey acerca dos cuidados prestados às pessoas com hemo- filia na Europa55, tem sido até registada uma re- dução do acesso ao apoio social e psicológico em Portugal. Sendo as intervenções psicológicas reconhecidamente eficazes na gestão da dor cró- nica57, é ainda algo surpreendente a escassez de estudos recentes que analisam a sua eficácia nas pessoas com hemofilia. Algumas investigações mais antigas mostraram a eficácia de interven- ções psicológicas na gestão dos sintomas asso- ciados à hemofilia, incluindo a dor, apontando-as como um importante recurso no âmbito dos cui- dados de saúde prestados no contexto desta doença58-62. Uma maior aposta nestas formas de
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