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neuromodulação, que tanto pode ser adaptativa nalguns casos, com melhoria de função, como pode, noutros casos, ser responsável por con- sequências como, por exemplo, desenvolvimen- to de dor crónica. Também reconhecemos que pode existir modulação a nível do sistema ner- voso periférico e do sistema nervoso autónomo2. A área da neuromodulação encontra-se em rápida expansão, tanto na compreensão dos mecanismos subjacentes como no seu potencial terapêutico. O termo neuromodulação pode ser definido como uma tecnologia com impacto numa interface neuronal e é a ciência de como intervenções elétricas, químicas e mecânicas podem modular ou alterar o funcionamento do sistema nervoso central ou periférico. Tem como caraterísticas o facto de ser: não destrutiva; re- versível e ajustável e pode ser feita de forma elétrica ou química. Os seus campos de aplica- bilidade abrangem a neuromodulação cerebral, controlo da dor, tratamento da espasticidade, de alterações gastrointestinais, urológicas e cardía- cas (como é o caso dos pacemakers e cardio- desfibrilhadores)3. Dentro da neuromodulação elétrica, encontra- mos a neuroestimulação periférica, que se tem vindo a desenvolver na área do tratamento da dor crónica. Apesar da menor quantidade de informação científica e clínica que suporte esta abordagem, quando comparada com a neuroestimulação da medula espinhal, alguns estudos têm vindo a demonstrar os efeitos da neuroestimulação pe- riférica na inibição da transmissão e processa- mento de um estímulo nociceptivo, demonstran- do, em parte, na Teoria do Portão, já descrita anteriormente e acrescentando outros mecanis- mos subjacentes, tanto a nível local como a nível sistémico e central4-6. Por volta dos anos 60, surgem as primeiras aplicações clínicas da neuroestimulação, perifé- rica, com a implantação cirúrgica do primeiro dispositivo de neuroestimulação7, essencialmen- te em base experimental. Apesar de parecer uma técnica promissora, estaria associada a uma taxa de eficácia relativamente baixa e a complicações importantes, nomeadamente lesões nervosas pela colocação dos elétrodos. Com o desenvol- vimento de elétrodos mais atraumáticos, a apli- cação de técnicas percutâneas de inserção, também menos invasivas, e a melhoria da técni- ca cirúrgica, as taxas de complicações foram-se tornando menores, aumentando a segurança nestas modalidades de analgesia8. Quanto ao mecanismo de ação da estimu- lação nervosa transcutânea (TENS), uma descri- ção mais detalhada referente a essa temática é feita na seccção “Transcutaneous electrical ner- ve stimulation - Mecanismo de ação e técnica”. Estas abordagens neuromoduladoras vieram oferecer mais opções à terapêutica multimodal e multidisciplinar de algumas situações de dor crónica, difíceis de controlar de outras formas. Estimulação de nervos periféricos A estimulação de nervos periféricos consiste na aplicação de um impulso elétrico diretamen- te num nervo periférico, e permite a neuromodu- lação de nervos específicos, ou plexos, muitas vezes não conseguida com os estimuladores da medula espinhal. Indicações e técnica A maioria dos casos selecionados para neu- roestimulação periférica corresponde a casos de dor neuropática, sendo que a seleção poderá ser semelhante à aplicada para a colocação de estimuladores da medula espinhal. Casos de dor crónica, severa, que não tenham respondido de forma satisfatória às medidas te- rapêuticas convencionais, entre as quais, farma- cológicas, fisioterapia, bloqueio de nervos peri- féricos ou TENS, poderão ser propostos para colocação de um neuroestimulador periférico. Torna-se importante a seleção dos doentes para esta técnica, nomeadamente através de uma avaliação psicológica, com critérios maiori- tariamente semelhantes aos usados na seleção para neureostimulação da medula espinhal9-11. Uma avaliação psiquiátrica e psicológica for- mal pode despistar algumas patologias psiquiá- tricas associadas a menor eficácia da técnica, ou problemas significativos de dependência far- macológica, bem como abordar expetativas do doente face a esta modalidade, nomeadamente, medo de falência da técnica, conflitos laborais, maritais e financeiros que possam influenciar o resultado da técnica. As expetativas e objetivos dos doentes devem ser claros e realistas, uma vez que as técnicas de neuromodulação repre- sentam terapias adjuvantes, que poderão ajudar a melhorar o quadro doloroso, mas não são curativas per si12. Um bloqueio de nervos periféricos poderá ser realizado, nomeadamente para documentar os nervos envolvidos que beneficiem de neuroesti- mulação. Posteriormente, deve ser realizado um ensaio temporário com neuroestimulação, através da colocação percutânea de elétrodos perineurais, que podem ser definitivos ou temporários. Estes são conectados a um gerador externo com as mesmas caraterísticas de estimulação que o neuroestimulador implantável. Durante este pe- ríodo, o doente determinará se existe melhoria na sua dor e se esta se traduz em benefício, para seguimento com a terapêutica de neuromo- dulação13. O sucesso no ensaio pode ser defi- nido como uma redução no nível da dor de, pelo menos, 50%, sendo que a duração do mesmo é variável entre centros, podendo igualmente ser aplicados critérios adicionais14. A colocação definitiva dos elétrodos pode ser feita através de exposição cirúrgica, colocando o elétrodo na proximidade do nervo, ou de forma percutânea. Preferencialmente, a colocação dos 33 R. Regufe, et al.: Estimulação Periférica: Mecanismos, Aplicação Clínica e Limitações DOR 


































































































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